quinta-feira, 6 de outubro de 2011

vários pontos de vista de Deus, será uma coisa má? (resposta a um cristão protestante)

Numa troca de ideias no facebook, surgiu-me a seguinte questão colocada por um amigo protestante: "Vários pontos de vista de Deus será uma coisa má?"  Devendo "pontos de vista" ser lido como igrejas e religiões com doutrinas distintas.
Não dei resposta por esta ser demasiado grande. Mas achei o tema interessante o suficiente para escrever aqui no blogue.


Vou-te explicar o porquê de não considerar a proliferação de igrejas cristãs uma coisa positiva como seria uma chuva de ideias ou a proliferação de vários pontos de vista.

Temos, antes de mais, a Natureza de Deus. Deus é, não muda, não foi, nem será. Simplesmente é ("Eu Sou Aquele que Sou" Ex 3,14). Portanto, cabe ao homem conhecê-lo da melhor forma possível. Ora, se eu não admito que Deus muda, embora possa encará-lo de formas diversas, conforme as suas características, não é possível que estejam certos aquele que diz que Deus castiga, bem como aquele que diz que Deus é infinitamente misericordioso. Das duas uma, ou ambas estão erradas ou apenas uma está certa. Se calhar o mesmo se passa com aquilo que as pessoas dizem de mim. Alguém me viu ter uma atitude mais intempestiva e acha que eu sou uma pessoa intolerante, mas quem me conhece melhor, sabe que isso é totalmente falso. Mas já é possível atribuir diversas qualidades a Deus. Tal como eu sou pai, filho, irmão, cunhado, sobrinho, amigo, esposo tudo ao mesmo tempo, por muitas mais faces nós poderemos reconhecer Deus. Nesse aspecto, nós cristãos estamos milhões de anos luz à frente de outras religiões. Deus revelou-se completamente aos homens através do Seu Filho. E é pelo filho que nós conhecemos o Pai. Tivemos o privilégio de uma revelação plena, ao contrário, por exemplo, dos Judeus que apenas têm uma revelação indirecta. Dentro do monoteísmo, para quem acredita que Jesus é o Filho de Deus, é lógico pensar que conhece melhor Deus que outras religiões que não acreditam em Jesus como Filho de Deus. Não fazê-lo seria não compreender o mistério da incarnação, ou uma falsa e não ponderada modéstia.
Utilizando o mesmo raciocínio - existiram aqueles que lidaram de muito perto com Jesus, diariamente, os apóstolos e algumas mulheres, e outros que o seguiam por toda a parte, escutando os sermões e vendo o que ele fazia, mas nunca privando com Ele. Quais deles conheceram verdadeiramente Jesus? Que testemunho escolherias escutar? Os apóstolos e as mulheres que privaram com ele, seguramente.

Até agora já concluímos que Deus não muda e que é possível ter conhecimentos errados, distorcidos ou muito parciais de Deus e que é possível legitimar melhor conhecimento de Deus a umas pessoas em detrimento de outras.

Continuando, múltiplas Igrejas implicam múltiplas diferenças doutrinais. E dentro dessas diferenças existem incompatibilidades. Daqui se deduz que alguém, para não dizer muitos, têm que estar errados na concepção de determinada natureza de Cristo e, por conseguinte, do próprio Deus. Não há obrigatoriedade de se concluir que alguém tem de estar certo. Também não é possível inferir, simplesmente pela lógica, que haja alguma que esteja mais vezes certa do que as outras.
Mas permitir que as coisas fiquem neste ponto, alimentando a multiplicidade e, por conseguinte, a lógica que não há forma de saber quem tem razão é, em certo modo, contrário ao propósito da revelação divina em Cristo. A infinidade e a multiplicidade que são saudáveis na forma de pôr os talentos a render, na forma de se identificar com Deus, nas tarefas que realizamos, tornam-se um problema se levarem à ambiguidade. Além disso, há as passagens dos evangelhos e as cartas de São Paulo que exortam a unidade do corpo em que Cristo é a cabeça. As diferenças entre as várias partes do corpo são importantes, na medida em que cada membro tem a sua função. E até podemos inferir que cada membro tem um conhecimento limitado e distinto, mas repito, não há incoerências ou ambiguidades. Tu dizias que a infinidade de opiniões não é má, mas eu digo, se da infinidade de opiniões não surgir a sintonia, o que fica é a dispersão, o afastamento.
Finalmente entra a legitimação. É necessário conferir não quem tem os melhores argumentos, mas os mais legítimos. E quem os tiver, tem maior probabilidade de estar a falar verdade, passe a demagogia e a vontade pessoal. Se não, corremos o risco de cada um ter o seu próprio Deus, interpretado à sua medida e conforme a necessidade. Corremos o risco de buscar apenas a lógica, o interpretar pelo desafio racional, mais que pela vontade de conhecer verdadeiramente Deus. Não é a pessoa que eu amo, mas sim o processo de o conhecer.
Ao conferir legitimidade, temos que aceitar os amargos de boca, o que discordamos e o que não compreendemos.
Concluindo, nós católicos encontramos legitimidade no Papa, no colégio dos bispos e na tradição, e vocês?

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Oh mão abençoada!

Há gente que tem uma necessidade tal de substantivar a sua fé, que até a critica protestante às imagens dos santos parece insignificante. Falo obviamente da quantidade incontável de crentes que após se presignarem, beijam a mão. Ou trocando por miúdos, beijam a mão após benzerem-se.

Isto levanta no meu consciente variadíssimas suposições e teorias sobre o que passará pelo pensamento daqueles que o fazem?
- Será que a mão e, por consequência, o braço, que faz o sinal da cruz ganha algum grau de beatitude ou poder que mereça adoração?
- Será que ao fazer o sinal da cruz, se invoca a figura de Cristo e, portanto, "mão que tocou o Senhor, é mão abençoada"?

Porquê estas interrogações? 
Pontos prévios:
1º - É evidente que num contexto não religioso, alguém que beije a sua própria mão carece de alguma acuidade mental, ou perece de narcisismo mórbido.
2º - Postulando que a presignação não traz qualquer significado à mão que a preconizou, deduzem-se as conclusões do ponto anterior.

Ora, a Igreja Católica é categórica: a presignação faz-se para invocação da santíssima trindade para o acto que estamos prestes a fazer ou a terminar de fazer. Significa "vou fazer isto em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" ou "fiz isto em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo".
Portanto, mesmo em contexto religioso, não há qualquer sigificado no ósculo em análise. O que nos remete, em potência, para a conclusão do primeiro ponto prévio.

Todavia, dada a quantidade de casos que vou observando, essa conclusão seria temerária.

A prudência leva-me à conclusão mais simples: é um hábito enraizado por alguns crentes que se presignam com um terço na mão, após o que, beijam a cruz do terço. Acto que leva a:
- uns fazê-lo por mecanização do acto, mesmo quanto não têm a cruz na mão;
- outros por imitação sem perceberem que os outros levam, ou deveriam levar a cruz.

 No entanto, reservo uma grande parcela, em sobreposição às anteriores, para pura e santa ignorância. 

quarta-feira, 4 de maio de 2011

És Católico? Sou! O que é que isso quer dizer? hum... bem...

- És católico?
- Sim, sou! - digo com orgulho.
- E és praticante?
- Claro - respondo, levantando mais um pouquinho o nariz de orgulho, como me ensinaram na catequese, que não se deve ter receio de mostrar que se é católico.
- E praticas o quê?
- Vólei, na escola!
- E o que significa católico? - insiste.
- Hum... bem... que se vai à missa? - gaguejo.

E agora uma adivinha.

Quantos católicos saberão o que significa católico?
Talvez a mesma percentagem de pessoas que sabem como é que o povo hebreu estando na terra prometida, precisou de ser salvo do Egipto por Moisés.

E atenção, isto não precisa ser matéria de catequese. Revela apenas falta de zelo.
Sou católico apostólico romano. Católico significa universal. Apostólico significa descendente da tradição dos apóstolos e fiel à sua missão. Romano significa que me conservo fiel ao Papa de Roma e a nenhum outro.
Já agora, o povo foi para o Egipto no tempo de Jacob, por via do seu filho José, para fugir à fome. A história é bem bonita. Se não conheces, atreve-te a ler. Aliás, toda a vida de Jacob é, no mínimo, fascinante.

E agora, outra adivinha:
Sabes o que aconteceria se tu, sendo católico, te achasses no direito de interpretar as leituras a teu bel prazer?
Estarias equívocado: serias protestante.
Ninguém está proibido de retirar conhecimentos e fazer interpretações pessoais de passagens bíblicas. Mas agora atenta comigo: Que fazer quando tu e o teu irmão decidem fazer o mesmo exercício e, chegando a uma passagem mais ambígua, ambos retiram um significado mais ou menos válido, mas contraditórios em si?
Ambos que eram cristãos, passaram a ser o Cristão do Reino de Deus e o Cristão dos Santos dos últimos dias.
Mas se a lógica nos diz que, por natureza, a bíblia não é contraditória, como retirar as teimas? Quem terá autoridade para dizer sim ou sopas? Talvez quem recebeu autoridade de Cristo, os apóstolos, ou seja, os bispos. E se mesmo os apóstolos entrarem em contradição? O Papa.

Pessoalmente não gosto nada da adjectivação católico praticante e não praticante.
O diálogo inicial, é um imaginário de mim a interrogar o meu eu com 14 anos de idade.
Já me perguntaram algumas vezes se eu era católico praticante, mas nunca de quê. É uma mágoa que tenho. Mas já tenho a resposta preparada na ponta da língua, para quando se der a efeméride: "de santidade. Mas vou muito no princípio, ainda só passei a uma cadeira, mas pelo menos foi com distinção: a de pecador."

segunda-feira, 2 de maio de 2011

O católico fixe

Recentemente descobri que existe uma nova categoria de católico.
Toda a gente fala do católico praticante e do católico não praticante.

Acho mais interessante falar do católico fixe (aka católico independente)

E porque é que ele é um católico fixe? Porque embora dê ares de filiação à Igreja Católica Apostólica Romana, rebatendo alguns comentários e opiniões obtusos e salientado o que de melhor ela tem (a obra social), desmarca-se dela em assuntos que não concorda, nem põe a mão no fogo para não alimentar polémicas. Vai à missa quando quer porque sente necessidade. E é agraciado por epítetos como "gosto de falar contigo porque tens opiniões próprias", "não és obtuso", "deviam haver mais como tu".
Desmarca-se do comum dos católicos por ter conhecimentos substanciais sobre doutrina e até alguma coisa sobre direito canónico, e saber tanto argumentar porque concorda ou porque discorda.

Na minha opinião, há por aí uma grande quantidade de católicos fixes. Pessoalmente prefiro-os aos não praticantes e até mesmo a alguns praticantes. Em bem da verdade, prefiro um sim ou um não, a um se calhar. Prefiro que alguém participe e bata com a mão no peito, a alguém que só bate com a mão no peito porque faz parte do ritual. Prefiro quem escuta a palavra de Deus, a quem só pensa "é sempre a mesma coisa". Prefiro quem se empenha em favor de quem precisa, não importa quanta dose de rebeldia, a todos os que passam a vida a acenar que sim mas só levantam o rabo do assento para compor a maquilhagem.

E tu, és um católico fixe, ou um católico que veste a camisola (ou melhor dizendo, despe a camisola - para partilhar com quem tem frio) não importa o que digam da Igreja?

sábado, 19 de março de 2011

A manipulação da opinião pública

Estava aqui a pensar com os meus botões sobre a tensão política que se vive neste momento e o meu pensamento escapou-se para uma memória relacionada com o aborto.
Para quem não sabe, os deputados são normalmente livres de votarem nas tomadas de decisão da Assembleia da República, contudo, os partidos políticos têm uma ferramenta muito útil que lhes permite obrigar todos os deputados da sua cor a votar num determinado sentido.
E foi isso que aconteceu no diploma do aborto. Como o PS tinha a maioria juntamente com os partidos de esquerda, obviamente que foi aprovado com o PSD a votar contra. Mas lembro-me perfeitamente que, ao noticiar esta votação, o canal televisivo salientou o facto de 2 ou 3 deputados do PSD terem votado contra somente por obrigação do partido, já que eram a favor do aborto.
Assaltaram-me logo várias questões. Não haverá nenhum deputado do PS contra o aborto? E havendo esses deputados contra, será que nenhum fez a mesma observação que os do PSD? Isto é, que só votavam a favor, por obrigação?
Pessoalmente, parece-me mais grave uma pessoa sendo contra votar a favor, que sendo a favor vote contra. Logo se é mais grave, mais razões tinha para declarar a sua opinião.
Não conheço suficientemente bem os hábitos do parlamento para tirar ilações, mas as minhas deambulações parecem-me lógicas. Deduzo, portanto, que de ambas as bancadas tenham surgido chamadas de atenção, ao facto de irem votar no sentido contrário à sua opinião por dever partidário.
No entanto, a televisão apenas achou oportuno mostrar que apenas uma minoria votou contra o aborto e, que mesmo dentro dessa minoria, houve pessoas contrariadas.
Se se deu o caso de, efectivamente, não haver ninguém do PS contra o aborto, então os media que me perdoem este comentário, e só posso estar feliz por nunca ter votado neles.

terça-feira, 15 de março de 2011

Psicologia? Não, obrigado!

Tenho uma pequena alergia de estimação por psicólogos. Chego inclusivamente a fazer um trejeito facial quando ouço a palavra.
Normalmente associam essa minha atitude a um certo e determinado grau de loucura. Mas é sempre seguido de espanto e incredulidade. Como é possível alguém ser contra a psicologia? Se não fosse possível eu não existiria. Como existo, é sinal que deve haver algum motivo.

Penso que não foi um dia de manhã, ao acordar, que pensei nisso, mas andou lá perto. E as culpadas por esta ideia são as famílias no concreto, ou a sociedade no geral. E um ponto de partida foi a seguinte constatação: "antigamente, quando os filhos se portavam mal, levavam dois tabefes; hoje em dia, levam-se ao psicólogo".

E este é o cerne da minha alergia. Não é a valia que um tratamento psicológico pode trazer em caso de traumas.  Mas a atitude das pessoas perante a psicologia: "Há um problema? Leva-se ao psicólogo!" Já não é a primeira vez que digo aqui, que há pais que se demitem da sua tarefa de educar e passam-na para os professores e para os psicólogos. As teorias educacionais modernas são importantes, mas levadas ao extremo assustam-me. Porquê? Porque revogam mais de seis mil anos de experiência, com bons resultados.
Um bom exemplo daquilo que quero dizer é a seguinte situação. O pai diz que o filho não pode fazer aquilo. O filho faz. O pai dá-lhe uma palmada. A teoria moderna diz que o pai, primeiro, deveria ter explicado ao filho o porquê de não poder fazer aquilo, e depois deveria ter repreendido com firmeza, castigando com a privação de algo que ela goste, mas sem palmada, porque não é tão traumatizante.
Qual é o meu problema perante esta argumentação? Antes de mais tenho uma divergência teórica: antes da criança agir ou deixar de agir devido ao motivo, deve fazê-lo porque é lhe é dito pelos pais. A explicação do motivo é secundária. Faz parte da educação das regras e dos valores, é impossível ser feito no imediato, deve acontecer ao longo de toda a infância. Se o pai manda, a criança deve obedecer e só depois questionar o porquê. Mas sobretudo, tenho problema com a aplicabilidade. Se já foi a 30ª vez que o filho fez aquilo, já está careca de saber que não deve e o porquê. Da minha experiência, a minha filha passa a vida a repetir os mesmos erros. Será que é necessário repetir a lengalenga sempre todas as vezes? Muitas das vezes o motivo ainda não é perceptível para ela, por isso é irrelevante. Depois, há castigos que não podendo ser aplicados imediatamente perdem efeito. Ela fica confusa quando lhe aplico um castigo por algo que ela fez no dia anterior.

Para mim, a psicologia é fundamental no tratamento de traumas e casos clínicos na generalidade. Tem alguma validade na orientação social, na gestão humana e organizacional e é tudo.

Para terminar, deixo-te com uma imagem parcial, ignorante e satírica da psicologia. Como é um psicólogo pode orientar se não pode interferir com a decisão, valores e moral do paciente?
Orientar implica indicar um rumo ou, no mínimo, apontar os vários pontos cardeais para que a pessoa se posicione. Mas não será o norte já um julgamento subjectivo do psicólogo?
Ajudar uma pessoa a encontrar o rumo por si própria é meritório, mas não seria mais fácil se se pudesse fechar logo à partida algumas portas?

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

"Acredito em Deus, não acredito é na Igreja"

Valham-me todos os Santos para que eu não tenha um ataque cardíaco quando ouço esta frase.

Primeira observação: acreditam num ser transcendente, invisível e todo poderoso;
Segunda observação: mas negam as dezenas de milhares de pessoas que constituem a hierarquia da Igreja e os milhares de milhões de fiéis.
Eu percebo o que elas querem dizer com isto, mas isso não invalida que elas tenham que o dizer como deve ser. O termo que usarei para os referir será, os arrogantes (explico entretanto, ou ficará subentendido :-) ).
Na mesma medida que a mim me dá uma síncope cardíaca e tremores frios quando oiço afirmações ridículas, papagaiadas, a eles basta-lhes ouvir, ler ou subentender o termo Igreja.
E porquê? Porque a Igreja não evolui, e deixa na idade da pedra milhões de fiéis que na sua inocência se deixam levar pelo conto do vigário e não pensam por eles próprios; porque os bispos e os padres são os piores; porque o Papa é rico e anda de carro blindado; o vaticano é podre de rico e não ajuda ninguém; há padres pedófilos, etc...
Por tudo isto "acredita-se em Deus, mas não na Igreja".

Tudo isto seria trágico se fosse mentira. Mas graças a Deus que é tudo verdade, pelo menos da forma como eu o vejo (que não garanto que seja da mesma forma que tu). Portanto, claramente existe aqui uma forma dissonante de encarar a vida entre mim e o arrogante. Talvez consiga explicar melhor dissecando ponto por pontos e subpontos.

a) Porque a Igreja não evolui, e deixa na idade da pedra milhões de fiéis que na sua inocência se deixam levar pelo conto do vigário e não pensam por eles próprios
        i) Não evolui
E passo a acrescentar, "não evolui na direcção que ele gostaria". Penso que o que ele queria mesmo dizer é que a Igreja deveria permitir que as pessoas fizessem o que queriam, mantendo o culto e o transcendente.
Efectivamente a Igreja não evolui. Embora tenhamos passado por diversas convulsões e concílios, tendo a forma se adaptado um pouco aos tempos modernos, o essencial permanece intocável. Refiro-me à Palavra, à ética e à moral. Fruto do estudo da história, o nosso entendimento da Palavra vai sendo aperfeiçoado à medida que vamos compreendendo os contextos em que os textos bíblicos foram escritos. Mas no compto geral, nunca passam de insignificâncias que visam aplacar a nossa ânsia racional de entendimento, sendo que a essência se mantém inalterada ao longo de 2000 anos. Por exemplo, através da passagem "do sacrifício de Isaac" entendemos, entre várias coisas, que Deus não deseja sacrifícios humanos em holocausto. À luz da história percebemos que esta passagem ganha outra dimensão já que a tradição pré-hebraica era rica em sacrifícios de primogénitos aos Deuses. E Abraão, sendo o primeiro monoteísta, quebrou com esta tradição violenta, instaurando o sacrifício animal em vez do humano. Ou seja, embora o entendimento da história dê uma visão mais clara daquela passagem, a interpretação mantêm-se.
Quanto ao facto da Igreja não ser permissiva nem "evoluir na direcção que muitos gostariam", não tem problema. Já há no mercado uma mão cheia de Igrejas À la Carte. Seitas à medida das vontades de cada um. Não chateiem, mudem-se!
Como referi no tópico sobre a relatividade, nós cristãos acreditamos em valores absolutos. Como por exemplo, a vida, a bondade, a paz, o amor, a beleza e o perdão. Se são valores absolutos, são em si incorruptíveis e insubjectiváveis. Logo imutáveis, não têm como evoluir. Porque todos eles derivam de Deus e Deus não muda, Deus é. Nessa medida a Igreja também não mudará.

       ii) fiéis que não pensam por eles próprios
Infelizmente esta é uma grande verdade e é um flagelo à escala planetária. Mas ao contrário do que os arrogantes pensam, esta não é exclusiva da Igreja. Uma obediência séria e comprometida com a Igreja traria inúmeros benefícios inequívocos à sociedade e à própria pessoa, pois, cultivaria a sua própria felicidade diariamente ajudando os pobres e necessitados. Torna-se um problema quando adicionamos outros vectores de influência contrária, nomeadamente, a publicidade e os media, que os incentivam ao despesismo e ao individualismo.
Consoante o apego material de cada indivíduo, penso que a racionalização crítica dos motivos por que se age, tem a propriedade de trazer um grande benefício pessoal e um pensamento independente. Por exemplo: somos levados a crer num determinado estereótipo de beleza física, de tal modo, que o sobrepomos ao cultivo da beleza interior com sentimentos de bondade, mansidão, alegria e paz. E se entendermos que o cultivo da beleza é um meio para conquistar um parceiro ou o simples sentir-se bem, qual das duas belezas será a mais eficaz? A aparência tendo um papel importante na conquista amorosa, torna-se quase obsoleta numa relação duradoura. Tem o condão de trazer muitas paixões, mas poucos amores. De modo análogo, se atendermos à necessidade de nos sentirmos bem, a alegria e a paz superam largamente a beleza física. Pior, se os padrões físicos forem demasiado exigentes, é natural que a auto confiança desapareça com o passar dos anos. Quero com isto explicar que, racionalmente, a beleza interior devia ser prioritária sobre a beleza física, mas existe uma pressão dos media brutal para inverter a prioridade, ou fabricar novos objectivos que foquem apenas a beleza exterior.


b) Porque os bispos e os padres são os piores
Tenho alguma dificuldade em contextualizar esta afirmação, mas penso que será no sentido em que os padres e bispos pregam uma coisa dentro das portas e, lá fora, são como os outros ou piores.
Mal de mim se não admitisse que toda a regra tem uma excepção. Mas é consensual que a hipocrisia é muito mal vista. Por isso, como humanos que são, os padres são tentados das mais variadas formas, e quando não resistem, fruto da sua própria hipocrisia, a sua acção parece mais condenável.
Mas na sua maioria, fora qualquer defeito pessoal que sempre existe, os padres são pessoas excepcionais na entrega e dedicação. Há uns poucos que chegam a ser extraordinários. Verdadeiras forças da natureza, incansáveis no auxílio aos outros. Mas aos olhos de muitos continuam os piores porque não atiram críticas a torto e direito como todos os outros, porque falam mal do consumismo e do materialismo, metem-se na vida de toda a gente, não nos dizem o que queremos ouvir, etc...
Mas esta frase tem sobretudo uma verdade intrínseca, embora quase imperceptível. Se ser o pior, significa ser o mais pecador, os padres têm obrigação de ganhar aos pontos a todos. Como referi no tópico sobre o pecado, a ignorância não é pecado. Logo, sendo os padres verdadeiros doutores sobre a matéria, devem conseguir identificar em si mesmos uma infinidade de pecados, que qualquer outra pessoa nem imagina que o sejam.

c) Porque o Papa é rico e anda de carro blindado e tem mil mordomias
Mais um conjunto de factos. O Papa é um ser humano brilhante, uma personalidade riquíssima e carismática. Não creio que tenha nenhuma riqueza ou património pessoal. Se o tiver, seguramente será a nível familiar, património esse sobre o qual não tem poderes particulares.
Se tem carro blindado é porque sabe que a posição que ocupa é dada a ódios cegos. E já diz o ditado "Fia-te na Virgem e não corras!" Que quer dizer, se estamos em perigo, há que não esquecer que Deus antes de mandar milagrosamente uma equipa de intervenção SWAT, deu-nos inteligência, capacidade de ponderação e prevenção. Se tenho inteligência para evitar ou prevenir uma situação complicada, não devo sentar e esperar que Deus resolva por mim, ou esperar que o pior não aconteça.
Finalmente, as mil mordomias, vestes ricas e palácios sumptuosos, vêm de pessoas que o querem servir, do significado das vestes e do património que não lhe pertence, mas deve cuidar. Ou alguém pensa que ele e os bispos vestem aquela catrefada de vestimentas, com todos os preceitos, cores e materiais, porque quer? É porque é aquilo que o seu cargo exige. A Igreja é uma instituição tradicionalmente simbólica. Os rituais, locais e materiais são profundamente simbólicos. Por exemplo, a água, o incenso, as flores, a vela, o ajoelhar, o vinho, entre muitos outros, mostram muito mais do que aparentam. Com os materiais sucede o mesmo. Há uma tradição antiga que se baseia na doutrina do dar a Deus o que temos de mais precioso. Portanto, quando fazemos alguma coisa para Deus é conveniente que o façamos de forma bela e dedicada, com sacrifício pessoal. Juntando tudo, percebe-se que é diferente usar uma flor ou diversos arranjos que perfumam o ar e alegram a vista, usar ouro em vez de cobre, vestir uma simples túnica ou um manto bordado.
É praticamente um dado adquirido que é o nosso coração e a forma com que fazemos as coisas que importa para Deus, mas enquanto ser humano, sei que há coisas que exigem maior sacrifício e que têm maior valor do que outras.
Parece que quando toca à Igreja, se exige um jeito forçado de humildade. Como se para ajudar o próximo, tivéssemos que andar andrajosos. É um sentimento de arrogância, exigir a humildade nos outros. Pois a humildade verdadeira não se exalta perante a riqueza ou a pobreza, aceita a incapacidade humana de conhecer todos os motivos e razões, e de ter um juízo falível.

d) O Vaticano é rico e não ajuda ninguém
Mais uma verdade em si. O Vaticano é rico em património e gere um gigantesco fluxo de dinheiro. Há quem ache que o Vaticano tem uma conta recheada de dinheiro que podia matar a fome a toda a gente no mundo, e que poderia vender todo o património para dar aos pobres. Qualquer uma das afirmações é falsa. Tão falsa como um gestor bancário ser rico, só porque gere um fluxo de milhares de euros por dia; ou o estado português poder vender a Torre de Belém a um consorcio Japonês! Não vejo o Estado portugês a vender território ou património (palácios, castelos, museus, florestas), para pagar o buraco da segurança social. Porquê? Porque não pode. Não lhe pertence. É apenas seu dever gerir e cuidar. E ainda assim tem um partimónio cultural, natural e histórico impressionante.
O Vaticano enquanto parte da Igreja, é efectivamente limitativo no auxílio directo aos pobres e necessitados. Mas faz comigo um exercício hipotético. Vamos estabelecer um objectivo: ajudar o maior número de pobres a comer uma refeição por dia. De acordo com os arrogantes, eu deveria vender a minha casa e os meus bens para não ser hipócrita já que eu não ligo muito às coisas materiais. Fiz isso tudo e consegui alimentar 10 famílias durante um mês e depois disso apenas uma família diariamente. Como vendi todos os meus bens, tive que alugar uma casa, mas continuei a pagar o colégio da minha filha e alimentar a minha família. Com a venda dos bens conseguir suportar 10 famílias durante um mês, mas o meu salário regular apenas me permite ajudar uma. Saldo: 10 famílias um mês (que voltaram a passar fome logo de seguida) + 1 família.
Agora, se em vez de dedicar o meu tempo e dinheiro directamente com o pobres, graças ao meu carisma conseguir cativar 10 ou 20 pessoas para fazerem o mesmo, gastando o meu tempo e dinheiro a auxiliá-las, e a cativar novos membros para a causa, e a ir pedir patrocínios para que os meus amigos consigam ajudar mais, e a criar eventos e organizações de angariação de dinheiro, quantas pessoas conseguirei ajudar? Directamente? 10 ou 20, pois não tenho dúvidas que ao cativá-los para a missão estou a ajudá-los a estarem bem consigo mesmos. Indirectamente? Incontáveis. Quanto contacto directo tive com os pobres? Zero.

e) Há padres pedófilos
E também há padres mentirosos, tristes, gulosos, psicóticos, ladrões. Mas são apenas uma minoria. Tal como em toda a sociedade. Têm o condão de nos mostrar que os padres também são humanos.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Mudança

Nunca te aconteceu pensares "no meu tempo é que era"?
Ou simplesmente "no meu tempo..."?
Penso que estas frases são utilizadas quando estamos perante alguém mais novo, e o tempo referido é o de quando tínhamos a sua idade. Ou no oposto, já as ouvimos muitas vezes de alguém mais velho. Mas se virmos o seu sentido literal, "no meu tempo é que era" é um paradoxo. O meu tempo é todo tempo enquanto vivo, desde que fui concebido até ao momento da minha morte.
Mas isto sou eu a divagar, onde quero chegar é que oiço esta expressão muitas vezes, como se o tempo actual tivesse lacunas que não existiam antes. De uma forma saudosista posso especular que crescer na década de 70 ou inícios de 80 foi muito mais fácil do que é hoje em dia. Nós podíamos andar na rua até tarde, se queríamos passar um bom bocado íamos ter com os amigos, a família reunia-se ao domingo à noite para ver a missão impossível, o Justiceiro ou o MacGyver. Tínhamos aulas só de manhã ou de tarde, todos sabíamos os nossos limites e todos levámos a nossa dose de palmadas e castigos quando os ultrapassámos.
Havia menos, muito menos focos de distracção (oferta de ocupações), e quanto mais recuarmos no tempo, mais isto é uma verdade, os jogos e brincadeiras eram em grupo, simples e muitas vezes inventados ou manufacturados. Não havia teorias sobre como educar os filhos, simplesmente educava-se.

Mas a verdade é que somos seres racionalmente complexos. Noutra circunstância seríamos os primeiros a argumentar as maravilhas dos tempos actuais. Pelo que vivi e pelo que vejo, todos somos criticos da mudança. Não há ninguém que seja a favor que tudo mude sempre, nem que nada nunca mude. A dificuldade está em encontrar alguém que consiga manter a imparcialidade. Eu consigo ver as comodidades que hoje usufruo como melhores do que as que tinha há 20 anos atrás, mas vejo com muita relutância a sofisticação e o leque de criminalidade actual ou a leveza com que se encara o núcleo familiar.

Um dos maiores problemas a que tenho assitido actualmente é a cultivação do ego e a desresponsabilização perante o outro. São as duas faces da mesma moeda. Quando penso em mim, não consigo pensar no outro. Coexistem e são cultivadas as noções de sucesso pessoal e de inevitabilidade social. Quero dizer que somos levados a crer que podemos ser tudo aquilo que quisermos, mas não existe forma de interferirmos com o que se passa à nossa volta, porque a liberdade individual é sagrada. E pelo que tenho visto, esta impotência perante a acção do outro chegou, inclusivé, aos pais perante os filhos. Já vi pais demitirem-se da tarefa de escolherem pelos seus filhos. E já vi jovens resignados com aquilo que o futuro possa trazer aos seus filhos, não aceitando ou acreditando no seu poder de os educar a serem ou fazerem algo. É para mim complicado ouvir um jovem dizer "mas como é que tu sabes que a tua filha irá para a Universidade? Não admites que ela possa escolher outro caminho?" Isto não anda longe de "Como é podes evitar que a tua filhe engravide na juventude ou se meta na droga?" Ilustra aquilo que referi atrás, demitem-se do seu papel pois estão impregnados de um sentimento de impotência social, a influência social (dos amigos, da televisão ou da escola) poderá ser demasiado forte para que as suas opiniões prevaleçam, ou no limite, têm medo de estar a limitar a liberdade do outro de fazer as suas escolhas.

A minha opinião sobre este tema é simples e descomplexada. A sociedade muda, é um facto. Empurra-nos e alicia-nos a todos para determinado rumo. A mudança traz oportunidades e desafios, benefícios e desajustamentos. Nem tudo é bom ou mau. Cabe-nos a tarefa de aproveitar os fluxos da mudança, mas fincar o pé àquilo que achamos que não deve mudar. E, la piéce de resitance, se algo não é bom para nós, possivelmente também não será para outros. Por isso, não basta lutar por nós. A isto chama-se responsabilização social ou, se estivermos a falar dos próprios filhos, educação.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

um seguidor

Estou extasiado.
Já sabia que tinha pelo menos um ou dois leitores assíduos a este blogue. Mas agora já tenho um seguidor. Quando chegar aos 12 fundo a minha própria igreja :)
Ontem um amigo disse-me que gostou do meu blogue, mas que achava que eu tinha muito mais para dar, que me estava a prender demasiado com religiosismos.
Confesso que a minha ideia inicial era essa. Mas de uma forma um pouco inconsciente, fui utilizando o blogue para dar respostas a ofensas e sentimentos que fui vivendo ao longo desde ano, ou simplesmente fazer eco de conversas que tive. E como a Igreja Católica está muito na berra, surge sempre um assunto religioso para falar. Só com raras excepções escrevi algo a partir de nada.

Talvez possa fazê-lo de agora em diante. Não há dúvida que não tenho dificuldade em dissertar sobre temas que estão relacionados com a vida humana. Talvez me possas ajudar. Sugere temas sobre os quais gostavas que me debruçasse.

Finalmente: quando chegar aos 12 seguidores marco um jantar com direito a prelecção. A este ritmo será daqui a 11 anos ;) Com direito a repetição sempre que alcançar multiplos de 12. Reservo, no entanto, o direito de revogar esta decisão se, por uma quase impossibilidade, o número de seguidores crescer a um ritmo superior a 12 por mês.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Jesus era Judeu, logo...

Não há muito tempo confrontaram-me com a seguinte questão: "Jesus era Judeu. Se ser Cristão significa viver à imagem Jesus e tentar viver como ele viveu, não deviam os Cristãos ser Judeus?" Obviamente a questão não me foi colocada assim tão direitinha, mas o objectivo da resposta era exactamente o mesmo.
Ao qual eu acrecentei: "não era só Judeu, era um excelente Judeu!"

Esta dedução é obviamente ingénua. E a minha primeira impressão transparece alguma dose de malícia da minha parte. Jesus não foi SEMPRE um judeu exemplar, pelo menos aos olhos dos Doutores da Lei da época. É sabido que ele era Rabi, pregava e discutia a Palavra nos templos. Isto diz-nos que ele começou por ser respeitado. Os evangelhos dizem-nos que já em criança ele mostrava grande sabedoria.
Mas sabemos igualmente que, no decorrer da vida pública, foi incomodando diversas forças e costumes estabelecidos. É sabido que Jesus colocava as pessoas acima das centenas de rituais e preceitos judaicos. A sua interpretação da Lei Mosaica (isto é, de Moisés) era única e holística (isto é, vista como um todo) e nunca aplicada às cegas. Jesus criticou fortemente todo o judeu hipócrita que vivia preocupado com as aparências. Fez coisas impensáveis àqueles Doutores da Lei, como privar com pecadores, não guardar os sábados e, acima de tudo, chamar-se Filho de Deus. Tirando esta última, que claramente poderia ser apontada por blasfémia, na minha opinião, nenhuma das outras poderia ser apontada como ofensiva à Lei Mosaica, já que sendo possível estabelecer uma hierarquia de preceitos, Jesus só quebrava preceitos para não incorrer em faltas mais severas à Lei. E nunca por discordar deles. É caso para dizer, porque estava preocupado com o que realmente era importante.

Agora, é preciso ser um grande desconhecedor da vida de Jesus para afirmar que para sermos à imagem dele, teríamos que ser Judeus.
Primeiro, se Cristo fosse um simples judeu, é claro que hoje não haveria cristianismo, a nossa principal referência seria Moisés e ainda teríamos o "olho por olho, dente por dente".
Segundo, acreditando que Cristo é o filho de Deus, fica difícil continuar a dar a mesma importância a Moisés, ou noutra pespectiva, dar menos importância à ressureição que à libertação do cativeiro no Egipto.
Terceiro, quando ouvimos o relato directo de Deus, em primeira mão, tudo quanto foi transmitido por intermediários, parece incompleto.

Portanto, Cristo não foi simplesmente um Judeu, nem tão pouco um Judeu como os outros. Aliás, só com Cristo a revelação divina ao homem ficou completa. Só aqui ficamos verdadeiramente a conhecer Deus, bem como, a saber na totalidade do Seu projecto para a humanidade.
Assim, ser cristão significa efectivamente viver a Lei Mosaica segundo os modos de Jesus, mas ainda assim, só depois dele a completar. E não há duvidas para ninguém sobre que caminho seguir perante uma lei incompleta e temporária e outra derradeira e definitiva.

domingo, 9 de janeiro de 2011

IURD

Igreja Universal do Reino de Deus.

Hoje vinha no carro a fazer zapping no rádio quando passei por uma rádio da IURD, onde falava uma pessoa desta seita. Confesso a minha ignorância, não sei que nome dar aos indivíduos que fazem os sermões. E acredites ou não, pela primeira vez na minha vida fiquei curioso para saber o que lá diriam e deixei-me ficar a ouvir.

O meu primeiro pensamento, após 2 ou 3 minutos de escuta foi, surpreendemente, será que eles irão para o céu?
Sei por experiência própria que não é apropriado tirar conclusões precipitadas. Corro o risco de generalizar algo que foi pontual. O problema é que a mensagem era inequívoca, que se resumia em:
- porque é a fé das pessoas é fraca?
- porque não provaram a Deus (isto falado em brasileiro não se percebe se era no sentido de saborear ou de demonstrar valor)
- como é que se prova a Deus?
- através dos nossos actos
- quais actos? (e agora vejam a subtileza da coisa)
- de generosidade, das nossas ofertas na nossa vida, [...] aqui na celebração, ao entrar nas portas do templo.

E depois continuou a dar mais uma série de argumentos para estimular a generosidade no templo. E além disso, afirmou que Jesus seria a resposta para o sucesso familiar, profissional e financeiro.
Não tive tempo para ouvir mais nada, porque cheguei ao meu destino. Mas esta parte final pareceu-me tirada da publicidade do Professor Muamba - extraordinário vidente, curandeiro, astrólogo e cientista.
Julgo não estar enganado por pensar que o sucesso financeiro mencionado, se refere efectivamente a poder ter muito dinheiro.
Já há bastante tempo que deduzi que existe uma proliferação de seitas porque, tal como existem restaurantes de comida chinesa, italiana, mexicana, etc, há que oferecer espiritualmente às pessoas que elas querem ouvir. E como as pessoas têm gostos diferentes, há que providenciar inúmeras maneiras de deixar as pessoas felizes. A regra que funciona sempre bem é ter um Cristo, pau para toda a obra e benefício.
A igreja Católica é chata porque não oferece o que as pessoas desejam. Bem pelo contrário, até constuma pedir coisas que não queremos. Por isso, como condenar alguém que está disponível para dar às pessoas o que elas querem ouvir, por determinado preço?

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Igreja? Religião? Que mentecaptos!

Hoje saiu uma notícia a dar conta do processo de santificação do Papa João Paulo II. Um certo jornal italiano especulava que o Vaticano teria validado o segundo milagre atribuído a João Paulo II.
Não foi a notícia em si que me fez escrever este post, mas antes os comentários que foram escritos online.
Exemplos:
- "Mas em pleno século XXI ainda há gente que acredita nesta treta de milagres? Só os beatos e fundamentalistas que não pensam e se deixam manipular por ideias arcaicas ...Usem da razão meus Senhores !!!"
- "As pessoas esquecem-se rápidamente dos milhões de pessoas que foram mortas em nome da Santa Inquisição! Esquecem-se dos milhares de nativos que foram mortos em nome da Cristianização! Acham que Deus permitiria isso? Esquecem-se das ligações secretas a governos tiranos, esquecem-se dos casos de pedofilia, esquecem-se dos tempos anti-ciência! Enfim..."
- ""A cura da religiosa francesa Marie Simon-Pierre, que padecia de Parkinson, tal como João Paulo II, foi considerada milagrosa, referiram".ENTÃO JOÃO PAULO II TINHA A MESMA DOENÇA, O PARKINSON, QUE A RELIGIOSA QUE CUROU E NÃO SE CONSEGUIU CURAR A SI MESMO COMO O FEZ À RELIGIOSA? ALGO AQUI NÃO BATE CERTO"

Temos aqui três tipos de pessoas: a primeira, um ateu puro e duro; a segunda, alguém que acredita em Deus mas tem uma revolta contra a Igreja Católica e; a terceira, a minha preferida, um amigo dos soldados que escarneciam de Jesus por altura da paixão.

O meu primeiro pensamento vai para a quantidade de pessoas que se revolta com estas coisas. Coisas que não lhes dizem respeito e que tão pouco compreendem, inspiram, por um lado, revolta e angustia, e por outro, sentimento de superioridade.
Por um motivo que não tenho a certeza de compreender, a Igreja, a política e o futebol têm a capacidade de exaltar espíritos.
Este pensamento entristece-me por um motivo. É sabido que alguém que profere palavras revoltosas ou iradas está revoltado ou irado.

O primeiro comentário, merece-me o seguinte apontamento. Os ateus são pessoas estranhas. Porquê, porque dizem que não acreditam em Deus, que a Ciência é que é. Isto faz-me espécie porque os valores católicos deram origem aos direitos humanos que temos hoje, ao invés, os cientistas estão sempre numa fadiga para se contradizerem e deitarem teorias existentes por terra. Não é estranho acreditar numa coisa que está sempre a mudar de opinião? A minha opinião sobre o processo científico é simples: É útil e deve ser estimulada.
A pessoa vai mais longe insultando quatro quintos da população mundial (estou a inventar este rácio, onde quero chegar é que é uma grande maioria) que acredita em milagres e fenómenos inexplicáveis. Que um ateu reconheça a incapacidade da ciência, eu aceito como argumento, agora negar taxativamente que estes eventos alguma vez aconteceram é ser cabeça dura. Será possível que não tenha ouvido falar da quantidade de casos documentados de remissão expontânea de doenças crónicas e terminais? Especulando que o sentido do comentário depreciativo é de que efectivamente as coisas inexplicáveis terão, mais tarde ou mais cedo, resposta científica, remete-nos para uma crise conceptual. Senão vejamos:
Ateu, por definição, rejeita Deus. Deus é, por definição, um ser superior, transcendente e poderoso. De tal modo que só por intermédio da fé, é possível acreditar em Deus. Pois fé, é uma capacidade que nos permite acreditar naquilo que não vemos ou experenciamos pessoalmente. Se nos confinarmos à versão comum de fé, esta é exclusiva da religião. Em lato senso eu argumentaria que não, mas para o caso é pertinente focarmos nesta posição. Agora diz-me se fores capaz: o que é que leva uma pessoa a afirmar que mais tarde ou mais cedo, um suposto milagre terá explicação científica? Eu diria, a fé na ciência. E esta hein? Afinal parece mesmo que a Fé está geneticamente programada na humanidade. E quando há um zelo excessivo em negar Deus, esta encontra outra forma de se manifestar. Aliás, é a negação absoluta de Deus que eleva a ciência a um estado de superioridade, poder e, pasmem-se, transcendência (ou não será a trascendência a capacidade de superar os limites do conhecido, no normal?) E vou ainda mais longe, enquanto nós Católicos temos uma fé normalmente fraca, fruto do desconhecimento, os nossos amigos ateus têm uma fé cega e absoluta na ciência. Porquê cega? Podem mil e uma teorias vir destronar mil teorias que no limite, qual uma assímptota, tem que estar a ciência.

O segundo comentário é uma critica directa à Igreja Católica. Provavelmente por um agnóstico, mas não é de excluir uma seita ou um protestante. Eu quando quero ofender alguém também gosto de distorcer, exagerar e atirar-lhe à cara os erros que ele fez no passado (por acaso nem é bem verdade, mas acho que é assim que a maioria das pessoas funciona). É facto sabido que não sou historiador, mas tenho uma costela de cientista, e quando quero ser levado a sério tento não cometer imprecisões e quando estou a especular, advirto o meu interlocutor. Primeiro, é muito fácil dizer que a Inquisição matou milhões de pessoas (adjectiva-la de Santa foi um golpe de mestre). Só em Portugal e Espanha, onde esta foi bem activa, deve ter matado mais de um milhão. O problema é que pelas minhas estimativas, no século dezasseis e dezassete a população da peninsula ibérica não deveria ter mais que uma dúzia de milhões de pessoas. É portanto legítimo afirmar que a Inquisição matou 1 em cada 10 pessoas? Para isso todas as famílias tinham que ter entre 2 a 3 familiares na fogueira. Parece-me claramente descabido. Uma única pessoa que tivesse morrido pela Inquisição já era demais, mas não queiram atirar-me areia para os olhos; outra imprecisão e ainda não saímos da 1ª frase: as mortes não ocorreram em nome da Inquisição, mas por intermédio da Inquisição em nome de Deus. Outro erro crasso é atribuir as mortes do afã descobridor dos nossos amigos espanhóis à evangelização. É um facto que haveria um excesso de zelo, mas não foi concerteza por causa do evangelho, mais sim da prata e do ouro. A igreja teve culpas no cartório com certeza, mas dizer que o frades e os padres andaram de espada na mão é exagero desde as cruzadas. E segue-se "la pièce de résistance" deste comentário: "Acham que Deus permitiria isso?" Das duas uma, ou ela está a insinuar que nada daquilo que escreveu antes aconteceu porque Deus não permite estas coisas, ou temos aqui um caso grave de falta de vocabulário e de linguarudice e, obviamente, de completo desconhecimento de Deus. Pois se aconteceu é porque Deus permitiu. Até o nosso amigo ateu vê isso. Toda a gente sabe que Deus não se intromete nas nossas escolhas. Depois continua com uma teoria da conspiração que eu não compreendo, logo abstenho-me de comentar, e termina com duas farpas bem afiadas que como se sabe é o equivalente a uma discussão entre miúdos "tu cheiras mal". É um comentário sempre à mão. A questão da pedofilia na Igreja faz-me lembrar a questão da gripe A no ano passado. De um momento para o outro, começaram a morrer pessoas por causa da gripe A. Chegou a ponderar-se uma pandemia. De um momento para o outro, a gripe sazonal deixou de matar pessoas. Ainda estou para saber as estatisticas que digam que a gripe A é mais mortal comparativamente à gripe sazonal, e que o número de mortos entre a gripe sazonal e a gripe A foi muito superior relativamente aos anos anteriores. O problema é que todo os outros casos de pedofilia (com excepção dos famosos) não dão notícias tão boas. Quem é que quer saber se o Sr Joaquim no alentejo é pedófilo? E para terminar, quanto aos tempos anti-ciência faz-me crer que o comentarista ainda acredita no Pai Natal. É que se lhe for perguntado em que medida a Igreja impediu o avanço da ciência, vai sair-lhe na ponta da lingua: Galileu. Teria muito a dizer sobre este assunto, mas para já basta-me isto: o que me dirias se eu afirmasse o "a terra gira sobre si"! Dirias concerteza "é um facto comprovado". E se eu justificar essa afirmação com observação das marés? Dirias "és pateta, porque as marés formam-se porque a Lua anda à volta da terra". E eu concluo, qual é o mérito de afirmar verdade justificando erradamente, ou arranjando justificações exotéricas? Galileu não foi condenado por dizer que a terra gira à volta do sol (a bem da verdade a ideia não era nova) mas por querer arranjar justificações exotéricas para isso, ou pior, querer extrapolar conclusões exotéricas para a dourina da Igreja. A afirmação que a Igreja é ou foi anti-ciência é uma vil e falsa afirmação. Não vale esquecer-se que ciência é um conceito moderno. Aquilo que nós hoje chamamos História, Quimica, Fisica, Economia, etc.. sempre foi Filosofia, Astronomia e Alquimia e a Igreja sempre foi a favor do conhecimento e embora pudesse ter alguma desconfiança com a Alquimia nunca deixou de ter padres Filósofos, Astrónomos e Alquimicos. A única preocupação, desde Santo Agostinho, foi na demarcação de Fé e Ciência e de evitar extrapolações de um para o outro.

E o meu preferido por último. Então o Papa João Paulo II curou uma pessoa e não se curou a ele mesmo, que tinha exactamente a mesma doença? É claramente o meu preferido porque os próprios soldados que levaram, escarneceram e maltrataram Jesus desde que foi condenado à morte, disseram exactamente as mesmas palavras. E ou muito estou enganado ou o nosso amigo comentarista não conhece esta passagem biblica. "salvou os outros, salve-se a si mesmo!" E ao proferi-las, em vez de estar a atacar a pensamento católico como era seu objectivo com este comentário, está simplesmente a reforçá-lo pois não há católico que não conheça esta passagem. E ficamos os dois felizes!
Não é minha intenção justificar a decisão de Cristo de morrer na cruz e não ceder à tentação de se livrar de tudo aquilo, mas este caso é muito simples: a canonização ocorre quando é comprovado um milagre por intercessão do beato. Isto quer dizer que o papa já estava morto quando ocorreu este milagre. A única coisa que a Igreja tem de se certificar é a que beato ou santo o curado tinha pedido intercessão. E mais, um milagre não acontece por vontade do intercessor, mas pela fé do curado. Mesmo Cristo, no seu tempo, não curava quem queria, mas quem acreditava que Ele o podia curar. Hoje em dia, ocorre de igual maneira, nunca seria o Papa João Paulo a ter o poder de curar, mas somente a fé do doente.