sexta-feira, 2 de julho de 2010

Aborto

Agora que já não existem penalizações para quem recorre a aborto, estando longe do lume que se gerou com esta questão, gostaria de tecer alguns comentários.

Cada vez mais me parece que a discussão à volta do aborto foi, é e será uma discussão virtual.
Eu sei que nem toda a gente consegue ser tão radical como eu, mas nesta discussão existe um ponto de partida, do qual não abdico.
A partir de quando é que o feto se transforma numa vida humana?
A partir de quando é que o feto passa a ter direitos distintos do da mãe?
Querem debater, então debatam estas questões.
Para mim é claro que o feto é uma vida humana a partir da concepção. Tanto quanto um bebé que acaba de nascer.
Existe uma questão debelatória de consciência: o feto nada sente até à 24 semanas de gestação por não ter sistema nervoso. Para os apoiantes do aborto, este parece ser o prazo moralmente aceite. Penso que isto quer dizer que passa de feto a ser humano quando ganha a capacidade se sentir. É um argumento válido. Embora ridículo. Qualquer médico do mundo consegue anestesiar qualquer ser vivo, de forma a não sentir dor. Aumentar o prazo moral das 24 semanas para as 32 ou 36 por este motivo seria perfeitamente válido. O problema é que com este tempo de gestação, o feto já se parece com um bebé. Já está totalmente formado. E aqui já não existe argumento que aplaque a consciência. Portanto, de todos os males o menor: para ter a certeza que o feto ainda não sente e ainda não se parece totalmente com um bebé, decidimos 10 semanas de gestação.
Mas não é por estas considerações que eu vejo o debate sobre o aborto como um debate virtual.
O grande argumento a favor do aborto creio ser a questão da felicidade da criança, das condições de vida que aquele bebé irá ter. Isto decorre de situações como pobreza, pais em idade juvenil, pais viciados ou com problemas e outras situações derivadas.
Façam um inquérito a jovens e adultos que nasceram e cresceram nestes contextos familiares e perguntem-lhes quem preferia não ter nascido. Quem preferia nem sequer ter tido a oportunidade. Julgo que uma pequena minoria preferia ter sido um aborto. À grande maioria, simplesmente ter-lhes-ia sido negada a possibilidade.
Esta é que é a virtualidade: as crianças que sofrem, podem não advir destes contextos, nem todas as crianças destes contextos sofrem. É estarmos a pôr uma chancela de infelicidade naqueles bebés e nem sequer lhes dar a oportunidade.
É claro que eu não suporto ver uma criança sofrer, mas quem sou eu para decidir à priori se aquela criança vai ou não ser feliz?

Outro grande argumento é a precariedade com que as mulheres acabavam por fazer abortos, aquelas que não tinham dinheiro para ir fazê-los a clinicas em Espanha.
Agora façam outro inquérito: quais os perfis das mães que vão a clínicas abortar? Que percentagem se insere no perfil demagógico? Suponho que uma minoria.

O único argumento que considero válido é aquele em que a mãe achando que o feto é uma parte de si e não um ser independente, tem o direito de fazer com ele o que quiser, até que o resto da sociedade advogue direitos ao bebé, e se responsabilize por ele, mesmo que seja contra a mãe, que segundo a lei é a partir das 00h00 das 10 semanas. Até lá, só tem que se agarrar aos tampões de consciência que mencionei no princípio.

Em resumo: ou pegamos num argumento ridículo e arbitrário ou virtualizamos a questão. Assim falamos nós de aborto, aliás, interrupção voluntária da gravidez.

Sem comentários:

Enviar um comentário